agosto 20, 2007

L.U.S.T. (13)

Hoje mais um estonteante, instigante e meliante capíluto de L.U.S.T., agora pratrocinado por Ordem Rude Productions LTDA.

Frase do dia: Não esquente a piriquita com pau fino.


L.U.S.T.

Nícolas Dias


Capítulo 13


Se você passa uma noite preso, não recomendo que você durma. Se dormir na prisão você vira mulherzinha. Eu ainda tive sorte ter sido preso com pessoas que eu conheço. Peraí, eu não to falando que ser violentado por pessoas que eu conheço é bom. Estou dizendo que eu tive sorte que de os caras que estavam na cela comigo não queriam me fazer de boneca inflável, mas apenas de saco de pancadas.

Eu só tive que passar a noite na delegacia por que o policial só teve a brilhante idéia de me ouvir e olhar na minha mochila pra ver que eu não tinha nem um narcótico e muito menos dinheiro. Sem os quais é impossível fazer comércio de entorpecentes.

Quando me levaram eu fiquei mais agoniado por que não sabia quanto tempo ficaria lá. Eu tinha que voltar ao trabalho e tinha que falar com a Melissa. A única preocupação que sumiu foi a de pagar as contas. Só o telefone e a luz somavam 1.111 Reais. Um atrás do outro, o número da suruba gay.

Meus colegas estavam pretendendo me encher de porrada há um bom tempo, mas não foi dessa vez. Bom, eu só escapei de ser surrado pelos meus colegas por que tinha outro colega meu que estava merecendo mais ainda uma surra: o doido que deixou o segurança abrir a mochila cheia de ecstsy.

Os caras começaram a vir pra cima de mim com aquele velho papo de me espancar.

- Agora é a hora de tu apanhar! – um deles diz.

- Se ele não tivesse gritado como uma menina, e chamado a atenção do guarda, agente não taria aqui! – diz o cara que apertou meu ombro, que é o mesmo que deixou o guarda abrir a mochila.

- Peraí, gente! Mas foi tudo culpa dele! – eu digo apontado pro cara da mochila.

E os outros olham pra ele dizendo “é mermo, foi ele!”. Se ele não tivesse se apurrinhado e gritado quando eu falei isso os doidos não teriam ido cima do cara, e se ele não tivesse empurrado os caras, eles não teriam enchido ele de porrada. Ainda me deu vontade de dar uns chutes na costela dele quando ele caísse no chão e de cair em cima dele com o cotovelo quando ele perde a consciência, mas eu preferi ficar quieto já que, por qualquer coisa, eu poderia ser o próximo.

Fora a aparição de uns repórteres do Metendo Bronca pra interrogar um rapaz que negava ter matado a namorada, dizendo que ela tinha cometido suicídio dando em si dezessete facadas, sendo quinze no peito e duas nas costas, e que ela tinha forçado ele a vestir roupas de mulher antes do suicídio, o que explicaria a forma como ele estava trajado; a minha estadia na delegacia foi normal, pra uma estadia em uma delegacia.

Sem falar na dificuldade de fazer as necessidades fisiológicas, cagar.

Quando se é preso você tem direito a uma ligação. Isso é bom quando se tem uma agenda, um celular com agenda, ou alguma coisa assim, ou quando você sabe o número de alguém que pode te ajudar. Mas o único número que eu sei é o de lá de casa, e infelizmente a única pessoa que eu posso falar lá em casa é o Rodolfo. Mesmo assim é melhor que nada.

Eu disse que queria dar um telefonema, e os outros logo se teleguiaram.

Um dos policias que estavam na delegacia era todo certinho e resolveu chamar a gente em ordem alfabética pra telefonar. Se não fosse ele ninguém ia telefonar.

Ele chamou primeiro o cara que tava desmaiado. Se chamava Alejandro. Ele saiu mancando.

Quando ele voltou era a minha vez. O policial abre a cela e diz pra eu ir. Enquanto estou saindo o Alejandro vai entrando e me fala baixo como se fosse pelo menos um pouco ameaçador.

- Vai ligar pra mamãe, é? – coisa que ele deve ter feito.

Não é legal mexer com a mãe de quem não tem mãe.

Esses moleques só precisam falar com seus pais ricos e pedirem ajuda que eles mandam os advogados e essas coisas. Pra tudo se dá uma merda de jeitinho brasileiro pra quem tem dinheiro. Sou mais o jeitinho iraqueano, de mandar as pessoas se explodirem. E o bom de lá é que elas obedecem.

Eu pego o telefone e disco o número de casa. Os dois policiais ficam me reparando, um olhando torto e o outro esperando pacientemente.

Quando eu termino de discar, o telefone dá sinal de ocupado. O Rodolfo deve estar de novo na internet, vendo sacanagem no orkut, como eu falei pra ele fazer, pra não pegar vírus.

Pois é, esse direito de ligação só é útil quando se sabe o telefone de alguém ou se anotou numa agenda, celular ou... na mão.

Então eu me lembro que antes de sair da Unama eu peguei o telefone da melissa e anotei na mão. Se tivesse anotado nos papeis que eu tinha, o número estaria dentro da mochila junto das provas do crime que eu não cometi.

O telefone ta meio apagado por causa do suor, mas é melhor do que ligar pro Pop Pizza. Malditos comerciais com musiquinhas que não saem da cabeça.

Eu ligo pra casa dela, o telefone chama algumas vezes, e quem atende é a Katerine. Ela não pode saber que eu é que estou ligando, se não ela pode falar mal de mim pra Melissa. Não é que eu tenha desistido da Katerine, mas eu não quero perder a chance de pegar a irmã dela.

Digo disfarçando a voz que eu gostaria de falar com a Melissa. Se o telefone daqui não estivesse uma bosta, ela ainda poderia ter reconhecido minha voz.

Ela grita ao telefone chamando a Melissa e quase me deixa surdo do lado direito.

Melissa atende e, quando eu respondo, ela fala o meu nome.

- Davi! – se a Katerine ouviu isso ela deve ter ficado mordida.

Ela pergunta se eu não ia ligar pra ela amanhã.

Eu digo, sem querer parecer desesperado, que eu preferi ligar hoje mesmo. Digo também que não posso demorar muito por que estou meio ocupado. Se ela achar que eu parei de fazer algo importante pra ligar é lucro pra mim, eu acho. Até por que ela não vai saber que a única coisa que eu poderia ter parado de fazer aqui era de ser moído no soco.

Ela pergunta se a gente vai sair amanhã.

Mesmo duvidando que eu estivesse andando livremente no dia seguinte, eu digo que é.

Ela pergunta pra onde a gente iria.

Mesmo duvidando que eu saísse tão cedo daqui, eu acho melhor eu decidir pra onde ir, pra que não acontecesse como aconteceu com a Katerine. Mas antes que eu diga alguma coisa ela fala pra gente ir ao shopping.

Ela pergunta pra qual shopping a gente iria.

Mesmo duvidando que eu não estivesse aleijado no dia seguinte, já que eu ia passar a noite inteira preso com meus colegas e um assassino pervertido, eu acho...

Ela diz pra irmos pro Iguatemi.

Ta bom. Lá é grande, e é claro, tem bebedouros pra beber água de graça.

- Ta bom, então ta marcado – ela diz. – Agora eu tenho que ir. Tchau!

No telefone a gente nem mostra a cara, mas eu sorrio só com o lado direito do rosto.

Eu digo tchau.

A ligação que eu deveria ter usado pra chamar um advogado eu uso pra marcar um encontro que talvez eu não possa ir.

Alguns dos meus colegas saíram de lá no mesmo dia. Outros desses otários também têm famílias que nem ligam para eles. Se bem que eu acho que os pais deles só os tiraram de lá pra não queimar o nome da família.

Eu só passei a noite lá por causa da incompetência dos policiais. Nós só fomos oficialmente detidos no início da noite, e eles só foram dar uma olhada nas provas no outro dia.

Eu dizia que era inocente, que tinha sido um engano, que eu tinha que voltar pro trabalho, mas só por que os lesos ficavam com frescura dizendo que iam mandar processar todo mundo, pois não deveriam estar presos, o policial respondia pra mim com algumas pornofonias.

Lá estavam um policial escroto e outro certinho. Como sempre. Mel Gibson e Danny Glover. O almofadinha estava furioso por que sempre sumiam coisas da gaveta dele. A coisa se repetiu tantas vezes que ele fez questão de prestar queixa sobre os furtos que aconteciam dentro da própria delegacia. Ele disse que se não devolvessem aqueles brigadeiros ele ia fazer justiça com as próprias mãos.

Eu preferi não dormir, pois minha integridade física poderia ser violada de várias formas ao menor cochilo, principalmente pelo cara vestido de mulher.

Talvez eu nem conseguisse dormir com dor nas costas por causa da minha coluna torta.

Até o amanhecer eu fiquei encarando todo mundo na cela. Os meus dois colegas que continuaram presos ficavam encarando, com os olhos arregalados, o cara de vestido. O cara ficava me encarando com uma cara estranha não sei por quê. E eu, pra não olhar pra ele, ficava encarando os meus colegas. E eles de vez em quando olhavam pra mim e levantavam o queixo, fazendo o sinal universal do “O que é que tu ta olhando?”.

Por volta das cinco da manhã, o Almofadinha está quase pra pegar um durex e pregar uma ponta na pálpebra e a outra na nuca. Quando ele pega no sono, o Escroto se levanta de onde estava, vai até a mesa, dá uma olhada na gaveta do Almofadinha, e depois vai olhar as provas.

Ele pega a faca que o doido usou pra suicidar a namorada, e depois mexe nas mochilas. Elas estão todas lá. Quando ele abre a minha mochila, o Almofadinha acorda.

O Almofadinha pergunta o que ele está fazendo. E depois responde a própria pergunta dizendo, tu ta mexendo nas provas, desgraçado.

O Escroto diz que ele só estava verificando.

- Verificando? Foi bem tu que mexeu na minha gaveta, né? – disse o Almofadinha. – deixa eu ver se não ta faltando nada no meio das provas.

Ele vai e olha na mochila.

- Cadê a droga daqui?

E o outro diz que não tirou nada da mochila.

O Almofadinha pergunta cadê, então.

Eu digo, era isso que eu tava tentando dizer desde ontem, eu não tenho nada a ver com isso, me pegaram de laranja, eu.

Esse último “eu” saiu sem querer.

O Escroto diz, rapah, esse é o comprador, por isso não tem nada na mochila.

E o Almofadinha pergunta, onde é que ta o dinheiro então.

Eu digo que eu já falei que foi um engano.

O Escroto olha pro Almofadinha e diz, ei, olha onde o moleque estuda, ele tem grana, mesmo ele podendo ser culpado, é melhor a gente soltar ele.

Deus abençoe o preconceito.

O Almofadinha concorda.

Eles me soltam e devolvem minha mochila.

Eu poderia até mandar soltarem os meus colegas, do jeito que os policiais queriam evitar problemas, mas eu acho que eles merecem ficar lá mesmo.

Eu saio na rua de madrugada, na hora que os primeiros ônibus estão saindo. Quase na hora de eu ir pro trabalho. Nessa hora eu já começo a me preocupar em não perder meu emprego pra poder pagar minhas contas.

Com certeza eu vou ser chamado a atenção no trabalho. Ainda mais por que eles estão cortando gastos, pra fazer algumas mudanças. O filho do dono quer fazer umas mudanças lá, ele assumiu a gerência por que o pai dele ficou doente depois de comer alguma coisa estragada ou algo assim. (Ver capítulo 10)

Os vendedores de bombons não entram no ônibus a essa hora, mas eu viajo de graça pra variar.

Algumas pessoas compram bombons. Alguns que estão saindo de casa pro trabalho e se esqueceram de escovar os dentes, e alguns que estão voltando pra casa depois de comer a mulher de alguém.

As pessoas me desprezam, não por que eu fui prezo, mesmo que só por uma noite, mas por que eu estou com os olhos vermelhos como os de um birrado e estou mal vestido. Se eu pedisse um emprego agora ninguém me daria, não porque fui preso, mas por que estou vendendo bombons.

Vou pra casa só tomar um banho de gato pra ir pra panificadora. Chegando lá, quando vou colocar minha mochila na mesinha da sala como eu sempre faço, a mochila cai no chão. É aí que eu percebo que o quitinete mobiliado que eu alugo não está mais tão mobiliado assim. Os móveis que não eram meus não estão mais lá.

- Rodolfo, onde ta a mesa daqui? A poltrona? E... cadê a minha cama?!

- Não te preocupa o colchão ainda ta aí. – ele diz como se tivesse resolvido tudo.

- Como assim? O que foi que aconteceu, cara?

Ele diz pra eu não me preocupar que ele ia recuperar os móveis. Diz que estava fazendo negócio com os caras lá da Unama, que já tinha dado o dinheiro pra um deles, que foi buscar a parada com os outros lá fora. E diz que quando eles voltaram, ele me viu lá com eles.

- E vocês foram pegos – ele continuou. – Eu tinha que levar a parada pra um cara pra pagar um favor que eu tava devendo pra ele – nunca fique devendo favores a ninguém. – como não tinha o produto eu tive que dar dinheiro. Mas eu não tinha dinheiro, aí eu tive que vender algumas coisas.


Continua...

3 comentários:

Juliana Koury Gaioso disse...

iixiiiii!!!!
ta ruim p ele mesmo...
mas esse rodolfo!

Danillo disse...

esqueci de comentar quando eu li... cara, eu quero que o Davi se $%$%*$& cada dia mais! Mas dá uma forra pra ele, sei lá, talvez ele consiga comer um "hot" (mas não vale fazer o bichinho ter caganeira depois pow... isso já é sacanagem!).

Anônimo disse...

eu ja disse que essa serie eh pra mim: sensacional..

e esse episodio eh simplesmente fabuloso. açao, suspense, drama, cagadas, corrupçao policial...

sim, sim.. isso esta cada vez mais completo..